Uma pesquisa realizada na Universidade de Toronto revelou que o uso do Twitter, agora chamado de X, está relacionado à redução do bem-estar dos usuários. Os efeitos incluem o aumento da polarização política, sentimentos de indignação e sensação de pertencimento.

A autora do estudo é Victoria Oldemburgo de Mello, 28 anos, doutoranda na instituição canadense.
A pesquisadora se graduou em psicologia na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) em 2020 e em seguida ingressou na Universidade de Toronto. Seu currículo ainda inclui um intercâmbio na Universidade Harvard em 2018.
“Nos momentos em que as pessoas reportaram terem estado no Twitter nos últimos 30 minutos, elas estavam menos felizes ou em um estado de bem-estar pior do que o normal”, aponta Victoria.
O artigo, publicado na prestigiosa revista científica Nature, foi sua tese de mestrado em 2021. Ela contou com a orientação dos professores Felix Cheung e Michael Inzlicht.

Para detectar os impactos do uso do Twitter, o estudo sondou 252 participantes. A amostra é representativa dos usuários da plataforma nos Estados Unidos e a coleta de dados durou sete dias.
Os participantes receberam uma enquete cinco vezes por dia durante o experimento.
Eles eram encarregados de responder se aram o Twitter nos últimos 30 minutos, como engajaram com a rede, por qual motivo abriram o aplicativo e como estavam se sentindo.
Victoria buscou entender quem usa a rede social, como usa e por qual razão.
“Um o diferente que tentei dar foi quebrar esse uso em diferentes motivações e diferentes comportamentos”, afirma a pesquisadora.
Há diversas formas de engajamento ivo e ativo na plataforma: curtir tweets, retweetar, comentar, publicar tweets, enviar mensagens, conferir os trending topics, visitar perfis ou apenas rolar o feed.
A sondagem também definiu cinco motivos que levam os usuários a abrir o aplicativo: entretenimento, escapismo, interação social, autopromoção e busca por informação.
Efeitos do uso do Twitter 2jk3r
Os dados fornecidos pelos participantes indicaram uma conexão entre o uso da plataforma e a diminuição do bem-estar. Pessoas que utilizam o Twitter para escapar e se distrair sentem mais insatisfação com a vida.
“A gente não esperava isso, na verdade. Eu achava que o Twitter ia se relacionar com mais raiva nos usuários, mas não achava que ia ser um declínio no bem-estar”, conta Victoria.
O uso ivo se relaciona com menor bem-estar, enquanto o uso ativo e social está ligado a uma maior sensação de pertencimento na comunidade.
Além disso, quem a o Twitter em busca de informações está mais propenso a sentimentos de indignação, raiva e repulsa.

A maioria dos participantes relatou um comportamento ivo na plataforma e a atividade mais comum é ler o feed.
A procura por entretenimento foi o motivo mais reportado, seguido da pesquisa por informação, interação, escapismo e, por último, autopromoção.
Os participantes que usam o Twitter com maior frequência sentem mais solidão. Ao ar o aplicativo, os usuários relataram o aumento do tédio. A pesquisa não identificou uma relação significativa com ansiedade.
Um resultado que surpreendeu os pesquisadores foi que pessoas que buscam entretenimento e distração na plataforma apresentam maior polarização política. A tendência também está relacionada com o costume de retweetar.
Por que as pessoas ainda usam a rede social? 3x674g
Diante dos impactos negativos, a pesquisadora Victoria Oldemburgo de Mello se pergunta: por que continuamos usando o Twitter? Uma pista está no aumento da sensação de pertencimento.
Muitos usuários encontram na plataforma um grupo social com pessoas que compartilham os mesmos interesses.
“É possivelmente o único achado positivo que a gente teve no nosso estudo”, observa Victoria.
A própria pesquisadora teve uma experiência similar.
“Em 2009 eu já era obcecada pelo Twitter. É bem engraçado porque na época eu era fã de uma banda que quase não tinha fãs no Brasil e a gente criou essa comunidade de fãs pelo Twitter”, lembra.

Os grupos virtuais, portanto, poderiam ser uma razão que mantém os usuários na rede.
Os participantes da pesquisa que reportaram usar o Twitter para se conectar com os outros (responder tweets, conferir os trending topics ou visitar perfis) se sentiam mais valorizados, respeitados e pertencentes à comunidade.
Contudo, os pesquisadores refletem se as relações sociais na plataforma compensam os impactos no bem-estar.
“Será que esse senso de pertencimento é importante o suficiente para as pessoas estarem dispostas a ignorar todos os efeitos negativos?”, questiona Victoria.
“Eu não tenho resposta para isso, mas é algo que me pergunto como uma usuária do Twitter que fez essa pesquisa e mesmo assim continua usando o Twitter”, ela ri.

Fundado por Jack Dorsey, Evan Williams, Biz Stone e Noah Glass em 2006 nos Estados Unidos, o Twitter foi adquirido pelo bilionário Elon Musk em 2022.
A compra no valor de 44 bilhões de dólares foi o maior negócio da história envolvendo redes sociais. Musk também é dono da Tesla e da SpaceX.
Rebatizada de X por Elon Musk, a plataforma a por alterações desde a aquisição. Os usuários questionam o futuro da rede diante da instabilidade do empresário excêntrico. Demissões em massa, fechamento de escritórios e novas funcionalidades como a versão paga levantaram incertezas.
Por trás da pesquisa 6v3u4z
A doutoranda Victoria Oldemburgo de Mello se interessa por redes sociais desde sua adolescência. Durante sua graduação na UFSC, chegou a programar seu próprio aplicativo.
“Eu queria criar uma rede social do bem, que gerasse efeitos psicológicos positivos as pessoas”, explica. Com a chegada da pandemia, porém, ela abandonou a ideia.
“Eu sempre fui fascinada por redes sociais e sempre tive essa ideia de querer criar uma alternativa, ou entender como elas poderiam ser positivas para as pessoas, ao invés de ser algo que gera consequências negativas”, afirma. Assim que entrou na Universidade de Toronto, ela aproveitou a oportunidade para pesquisar a temática.

Victoria foca atualmente os estudos na relação das pessoas com a inteligência artificial.
Seus projetos futuros buscarão compreender os impactos psicológicos do avanço dessa tecnologia, com robôs cada vez mais parecidos com os seres humanos.
A pesquisadora espera que sua tese de mestrado sobre o Twitter inspire mais investigações a respeito do uso das redes sociais.
Os resultados podem, inclusive, influenciar os desenvolvedores a moldar plataformas mais saudáveis.
“Nossa pesquisa não vai ajudar a banir redes sociais, mas vai ajudar a informar designers e pessoas que vão tomar decisões sobre quais funcionalidades desenvolver, sobre qual tipo de algoritmo essa plataforma deve ter”, acredita Victoria.